terça-feira, 22 de maio de 2007

Impermanência

Instado por seus súditos, um rei acabou chamando aquele que seria o “mais sábios dos sábios” para ouvir seus conselhos. Mas o velhinho foi bem reticente. Olhou o rei de soslaio e entregou-lhe duas mensagens dobradas. “Essa daqui você coloca no anel da mão esquerda e só leia quando estiver no seu pior momento. A outra, no anel da mão direita, e deve ser lida quando estiver em seu melhor momento.” Voltou-se e se foi. Os anos passaram e a fatalidade fez o rei perder o trono e se meter numa batalha sem chances de vitória. Sedento, perdido numa floresta e com a noite caindo, decidiu abrir a mensagem da mão esquerda. Pegou o papelzinho e firmou os olhos, não crendo no que lia: “Isso vai passar.” Ficou furioso. Viu um rio e se atirou, tentando dar cabo à própria vida. Por sorte havia um pescador – sempre há um! – que o resgatou e restabeleceu-lhe as forças. Tanto que pôde articular novamente seu pessoal, seu exército e conquistar de volta o reino. Ao se deleitar com o novo triunfo, pousou a mão direita no trono e viu o anel. Apanhou a mensagem e leu: “Isso vai passar”.

Esse sentido de impermanência é básico no budismo, a idéia de que nada do que vemos ao redor estará aqui para sempre. Nem o sol, nem as estrelas (essas talvez nem estejam nesse exato instante, pois só vemos seu brilho, que viajou milênios até aqui chegar), nem as montanhas. Muito menos nós. Muito menos a condição em que nos encontramos. É interessante pensar na impermanência e nessa história quando vemos pessoas, amigos até, encantados soberbamente com suas condições, cargos, vantagens, etc. Como ouvi um filósofo dizer: passam anos construindo a escada e quando chegam ao topo, substituem-na pela ilusão de que sempre estiveram lá. Assim, a pessoa, mesmo que se ferre, irá sempre se deixar levar pela ilusão de que seu “eu” triunfou sobre as circunstâncias. Até que, como no poema de Drummond, o elefante se desfaz. “A cola se dissolve/e todo o seu conteúdo/de perdão, de carícia,/de pluma, de algodão,/jorra sobre o tapete,/qual mito desmontado.” Tudo bem. Isso vai passar.


Smokey
(se clicar na imagem acima ela vai ser ampliada...)

2 comentários:

Anônimo disse...

Perfeito.

Carline :) disse...

Om mani peme hung