sexta-feira, 7 de março de 2008

O que é a tristeza?


Período difícil, sentimentos, emoções, tristeza. Como num fechamento de ciclo. Mas prefiro acreditar que se trata de uma pralaya, ou seja, período em que se pára tudo para colocar a casa em ordem e poder começar de novo, embora essa ultima parte ainda pareça distante.
Como se não bastasse, ainda tem o trânsito, as horas em fila dentro do carro com calor intenso lá fora. Aí, no farol, se aproxima o homem na cadeira de rodas, olha para mim e diz:
- Tem um trocado aí? R$ 100 tá bom..., brinca.
Tocado por sua simpatia, olho para ele e respondo:
- Ih, rapaz, hoje está triste!
E acabo acompanhando a frase com um sorriso que retribui a sua simpatia. Ele emenda a resposta:
- Quem me dera se todas as pessoas que estão tristes me dissessem isso com o mesmo sorriso com que me diz...
Me surpreendo. Ele pega a deixa e conta que nos doze anos em que vive pedindo dinheiro nas ruas já encontrou muita gente realmente triste e infeliz.
- O meu maior desafio não é pedir, mas não deixar que a tristeza das pessoas me contagie. Pois se isso acontece, acabo me matando!
Não economizei novos sorrisos enquanto ele dizia tudo isso. Mas o farol já mudava e eu tinha de acelerar. Já me afastando, ouvi:
- Obrigado pela sua “tristeza”!
Assim, entre aspas mesmo. Deu para ouvir.

quarta-feira, 23 de janeiro de 2008

Thank you God

Um dia eu ouvi My Favorite Things com John Coltrane e decidi aprender a tocar sax tenor, apesar de, na sua versão ele a interpretar com o sax soprano. Peguei a indenização que havia recebido de um processo trabalhista contra a Folha de S. Paulo, dei uma pesquisada e comprei um Weril, para quem não sabe, o fusquinha dos saxofones. Entrei numa escola e estudei dois anos, cheguei a tocar a melodia de My Favorite Things e outras coisas mais. Depois, as contingências da vida interromperam a minha brilhante carreira e a minha pretensão de querer chegar próximo de Coltrane, aquele que molhou os pés nas águas do Divino, como diria o sábio Ramana Maharshi.
Coltrane fez da sua vida e do domínio do seu sax tenor (e por algum tempo o soprano, que havia ganho de Miles Davis ao sair do seu quarteto) o seu caminho espiritual. Isso de uma forma nunca antes arriscada por algum outro músico de jazz e, claro, em plena década de 60. O marco maior dessa transcendência musical é o clássico álbum A Love Supreme, espécie de suíte em quatro partes composta por Coltrane após passar por uma experiência de revelação. Lançado em 1965, o álbum se tornou mitológico e influenciou gerações inteiras de músicos de jazz , rock, pop, reggae, folk, etc etc. As quatro notas que são a base da suíte, tocadas pelo contrabaixo de Jimmy Garrison, foram usadas à exaustão nos últimos 42 anos em centenas de composições. Coltrane também inaugurou com o álbum o “jazz psicodélico”, que rendeu músicos como Pharoah Sanders, Alice Coltrane (sua mulher), Archie Shepp, etc. (Quer saber mais?)
Acabei de ler o livro A Love Supreme – A Criação do Álbum Clássico de John Coltrane, de Ashley Kahn, leitura não só para fanáticos como eu, mas imprescindível para conhecer a sua trajetória espiritual, concluída prematuramente dois anos após a gravação do disco antológico, por causa de um câncer no fígado. Assista Coltrane interpretando My Favorite Things (completo) e um raro vídeo de A Love Supreme (trecho). Tem também um ótimo post sobre o livro n’O Franco Atirador. Conselho: ouça mais de uma vez, pois ouvir também pode ser uma revelação...

domingo, 20 de janeiro de 2008

Não nos deixe sós!!!!!!!!


Alôu!?
Alôôôôuuuuuu!!??
Tem alguém aí????
´Chuquinãoné???...

2008 começou faz um tempinho, esse ano a gente volta.
Muita coisa pra contar e mostrar, esse blog será ativo como poucos nesse mundo doideca!

Tem alguém aí???

Vaca Zen

PS. A foto ali em cima é do alemão Ralf Tooten, legal o cara.
E não, na foto não somos eu e o Smokey, apesar do shadu lembrar muito o Smokey. Peraí, agora eu fiquei na dúvida...

quarta-feira, 4 de julho de 2007


"Meditar é como entregar uma enorme e aprazível campina a uma vaca intranqüila. Ela poderá ficar agitada por algum tempo no seu campo enorme, todavia em certo ponto, visto que há tanto espaço, a intranqüilidade torna-se irrelevante. Assim, a vaca come, come insistentemente, relaxa e adormece."

Chögyam Trungpa

terça-feira, 19 de junho de 2007

Otto


Bicicleta, harmônica, conversas, risadas, bons conselhos, piadas, cachacinhas, churrasco, brincadeiras, honestidade, solidariedade, apoio, fé, otimismo, perseverança, inteligência, disposição, entrega, futebol, música, alegria, enfim.


Semana passada faleceu o Otto. Grande amigo, está conosco.


Boas histórias para contar.


Vaca Zen

quarta-feira, 13 de junho de 2007

Pula a fogueira...

Posso estar sendo leviano ao falar de um livro sem concluir a sua leitura, mas acredito que para concluí-la preciso falar um pouco dele... Trata-se da biografia desautorizada de Roberto Carlos, fonte inesgotável de pautas jornalísticas – só perde para Britney Spears e Paris Hilton – e que foi condenada à fogueira pelo juiz que queria que o cantor ouvisse seu CD demo. Sim, para quem não sabe, na audiência em que a editora concordou em não só retirar os exemplares à venda como destruí-los, o juiz do caso, que tem por hobbie cantar, encerrou a audiência entregando seu cedezinho ao cantor. A decisão aliás – mais um parêntesis aqui nesse post que não vai logo direto ao assunto – rendeu uma louvável reação de Paulo Coelho em artigo publicado na mídia, a melhor coisa que fez desde que compôs Gita com Raul Seixas...
Bom, o que o autor Paulo César de Araújo fez foi, na impossibilidade de ter o cantor como sua principal fonte, escrever um livro não de um pesquisador – a despeito dos 15 anos que passou preparando-o – mas de um fã apaixonado pelo seu biografado. Isso porque ele parte do mito Roberto Carlos para escrever a biografia e não do artista. Logo de início ele abre dizendo que só entrevistou o cantor uma única vez, mesmo assim levado por outro repórter, na “carona”. Daí, os 15 anos foram de pesquisa indireta, tentando recompor a vida do ídolo a partir de depoimentos, recortes de jornal, visitas aos locais em que ele viveu, etc. Sim, Araújo fez um trabalho minucioso, mas... apaixonado! Há coisas incompreensíveis, como um capítulo para defender a Jovem Guarda como o movimento que “revolucionou” a música brasileira por ter introduzido os três acordes do rock – fez isso antes do tropicalismo – e que a MPB foi retrógrada ao rejeitar as guitarras. Na verdade havia todo um contexto sócio-político, tanto para a reação da MPB quanto para o sucesso do iê-iê-iê, assim como para a mistura promovida pelo tropicalismo. Era, enfim um período de rótulos num processo de confirmação do que hoje sabemos ser a música pop. Não há sentido em querer “fazer jus” à Jovem Guarda quarenta anos depois, mas sim em entender como as coisas se deram, os atores, os movimentos, as ações, etc. Araújo faz isso, mostra os detalhes, mas acaba conduzindo uma defesa apaixonada do seu ídolo, o que compromete o resultado da sua análise... Só para assinalar outro apego do autor: para louvar a longevidade da parceria Roberto-Erasmo, ele fica medindo as durações de grandes parcerias da música brasileira. Tem algum sentido isso? Reconheço a grande importância de Roberto Carlos na música brasileira, nem tanto pela Jovem Guarda, que promoveu rupturas e coisa e tal, mas pelo que compôs e cantou na década de 1970, que foi de uma renovação tremenda em meio ao cenário musical da época, em plena ditadura. Agora, passada essa fase, sua contribuição à música brasileira foi cada vez mais pontual e sua obra cada vez mais repetitiva. Além do que a persona Roberto Carlos beirou o folclorismo que parece se abater como uma síndrome sobre aqueles que vivem o sucesso prolongado – vide o exemplo mais bizarro que é o de Michael Jackson. O desfecho do caso da biografia é coerente com essa lógica. Quem escreve sobre Roberto Carlos é ele mesmo - se é que fará mesmo a sua própria biografia um dia - e quem ousar ir contra esse “princípio” será punido com a fogueira. Para sorte de Araújo, foram só os livros.

quinta-feira, 7 de junho de 2007

Catira na Catraca




Já comentei algumas vezes que gosto de andar de ônibus pela capital paulista.
Claro que fora do horário de rush. Transporte coletivo é um problema que, às vezes, parece crônico, espero que não seja.

Mas, fora do horário de pico, eu gosto. Já li vários livros em ônibus.
Só para você saber: terminei, uma vez, Cem anos de solidão no busão!
Depois terminei em casa de novo.
Mas terminar um livro, levantar a cabeçar e olhar a caótica metrópole passando pela janela...me dá uma sensação que nem vou tentar explicar.

Mas outras experiências são possíveis.

Vai daí que estava num bumba esses dias e o cobrador me chamou a atenção.
Já um senhor, na casa dos 60 anos.
Bigode hirsuto e branco, costeletas até o meio da bochecha, bem tratadas, cabelos ondulados, penteados para trás, flocados como paina.Não usava uniforme, vestia uma camisa xadrez, em tons de vermelho e azul.Faltava um lenço, só um lenço encarnado para completar o quadro.

Ele parecia um personagem saído da minha infância, direto de uma festa, direto de um grupo de catira para aquela catraca!

E, de repente, ele abre a boca:
“Pessoar, favor, ói: só passa o cartão na hora qui ocêis fô ´travessa a catraca! Sinão despoi ela trava e dá pobrema pra nói! Quem vai pras Crínica dece no próximo!”

Genial! Ele saiu da roça, mas a roça não saiu dele!

E fui transportado para lá, para minha origem também, em um meio de tarde, direto da av. Rebouças!

Cheguei a ouvir: Trá-tá-tá-tá- tátá – Clap-Clap- Clap-Clap-ClapClap-trá!

E, claro, um repique de viola ficou soando em meu ouvido, até a hora do Angelus.

Vaca Zen

Ps.A foto lá em cima é de autoria de Reinaldo Meneguim, e os catireiros são do Grupo de Catira Garulhense