quarta-feira, 13 de junho de 2007

Pula a fogueira...

Posso estar sendo leviano ao falar de um livro sem concluir a sua leitura, mas acredito que para concluí-la preciso falar um pouco dele... Trata-se da biografia desautorizada de Roberto Carlos, fonte inesgotável de pautas jornalísticas – só perde para Britney Spears e Paris Hilton – e que foi condenada à fogueira pelo juiz que queria que o cantor ouvisse seu CD demo. Sim, para quem não sabe, na audiência em que a editora concordou em não só retirar os exemplares à venda como destruí-los, o juiz do caso, que tem por hobbie cantar, encerrou a audiência entregando seu cedezinho ao cantor. A decisão aliás – mais um parêntesis aqui nesse post que não vai logo direto ao assunto – rendeu uma louvável reação de Paulo Coelho em artigo publicado na mídia, a melhor coisa que fez desde que compôs Gita com Raul Seixas...
Bom, o que o autor Paulo César de Araújo fez foi, na impossibilidade de ter o cantor como sua principal fonte, escrever um livro não de um pesquisador – a despeito dos 15 anos que passou preparando-o – mas de um fã apaixonado pelo seu biografado. Isso porque ele parte do mito Roberto Carlos para escrever a biografia e não do artista. Logo de início ele abre dizendo que só entrevistou o cantor uma única vez, mesmo assim levado por outro repórter, na “carona”. Daí, os 15 anos foram de pesquisa indireta, tentando recompor a vida do ídolo a partir de depoimentos, recortes de jornal, visitas aos locais em que ele viveu, etc. Sim, Araújo fez um trabalho minucioso, mas... apaixonado! Há coisas incompreensíveis, como um capítulo para defender a Jovem Guarda como o movimento que “revolucionou” a música brasileira por ter introduzido os três acordes do rock – fez isso antes do tropicalismo – e que a MPB foi retrógrada ao rejeitar as guitarras. Na verdade havia todo um contexto sócio-político, tanto para a reação da MPB quanto para o sucesso do iê-iê-iê, assim como para a mistura promovida pelo tropicalismo. Era, enfim um período de rótulos num processo de confirmação do que hoje sabemos ser a música pop. Não há sentido em querer “fazer jus” à Jovem Guarda quarenta anos depois, mas sim em entender como as coisas se deram, os atores, os movimentos, as ações, etc. Araújo faz isso, mostra os detalhes, mas acaba conduzindo uma defesa apaixonada do seu ídolo, o que compromete o resultado da sua análise... Só para assinalar outro apego do autor: para louvar a longevidade da parceria Roberto-Erasmo, ele fica medindo as durações de grandes parcerias da música brasileira. Tem algum sentido isso? Reconheço a grande importância de Roberto Carlos na música brasileira, nem tanto pela Jovem Guarda, que promoveu rupturas e coisa e tal, mas pelo que compôs e cantou na década de 1970, que foi de uma renovação tremenda em meio ao cenário musical da época, em plena ditadura. Agora, passada essa fase, sua contribuição à música brasileira foi cada vez mais pontual e sua obra cada vez mais repetitiva. Além do que a persona Roberto Carlos beirou o folclorismo que parece se abater como uma síndrome sobre aqueles que vivem o sucesso prolongado – vide o exemplo mais bizarro que é o de Michael Jackson. O desfecho do caso da biografia é coerente com essa lógica. Quem escreve sobre Roberto Carlos é ele mesmo - se é que fará mesmo a sua própria biografia um dia - e quem ousar ir contra esse “princípio” será punido com a fogueira. Para sorte de Araújo, foram só os livros.

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